Capítulo 56

O rebuceteio rolou solto até altas horas. Quando finalmente terminou, meu maxilar doía de tanto chupar e minha buceta ardia — não mais de prazer, mas de tanta esfregação que parecia em carne viva.

A Diana, coitada… parecia que tinham jogado tinta nela do umbigo pra baixo. A pele marcada, as veias saltando vermelhas por baixo, e a ximbica dela, que normalmente quase não tinha diferença de cor pro resto do corpo, estava roxeada, inchadaça. Uma visão de fim de guerra.

A menos estragada foi a Mariana, claro. Aquela sempre dava um jeito de sair da farra mais inteira que todo mundo.

O quarto fedia. Mas fedia tanto, que tive que abrir a janela e ainda jogar um bom ar no ambiente, porque o cheiro de boceta, suor e gozo tinha impregnado como uma nuvem. Eu dei uma geral rápida, ajeitei os lençóis, joguei roupas num canto, enquanto a gente ria do estado deplorável.

No fim, tomamos outro banho, cansadas mas ainda rindo, e fomos pra cama. O próximo dia prometia — e a apreensão já rondava todo mundo, porque a gente sabia que aquela noite não tinha sido nem metade da confusão que ainda vinha pela frente.

Eu acordei primeiro. Quase não tinha conseguido dormir na verdade, porque a cabeça só martelava: será que tinha sido uma boa ideia chamar meu pai? Era o meu juízo cobrando, aquela voz chata que insiste quando o tesão passa.

Levantei, fui pra cozinha fazer café e ainda saí pra comprar pão. Quando voltei, as meninas já estavam lá embaixo me esperando.

Minha mãe, claro, foi a primeira a abrir a boca:

— Hoje eu não quero vocês abrindo o bico, hein? Podem ficar aqui na sala, mas não abram a boca pra nada, ouviram?

— Simmm, senhora — eu e Diana respondemos em coro, feito duas colegiais na diretoria.

— E você, Mariana… hoje não é dia pra brincadeiras. Você não devia nem estar aqui.

— Eita, tia… — protestou Mariana, já fazendo bico.

A manhã correu tranquila, sem grandes acontecimentos, e logo emendou num almoço pesado. Depois da sobremesa, a Diana começou a cismar que queria ir embora.

— Não sei… acho que mudei de ideia. Eu nem ligo pro dinheiro, só tô decepcionada com ele.

E era verdade. Grana nunca foi um problema sério pra ela, mas eu queria que ela ficasse. Queria ela ali, do meu lado, pra ele ver nós duas juntas e sentir o peso disso.

— Olha, eu não vou te segurar, Di… mas se você for embora nunca vai ter o prazer de lavar a sua alma.

Não sei se minhas palavras convenceram ou se foi a chegada do meu pai.

Meu pai é um homem de meio metro de altura, mas o tamanho nunca importou. O sujeito é… digamos, rústico. Apareceu vestindo uma camisa do Flamengo e trazendo na cintura o volume tradicional: a arma. Em minha homenagem, ele tinha dado o nome dela de Julinha.

Minha mãe respirou fundo, tentando se manter firme. Meu padrasto, esse, gelou. Até hoje ele não esquece o dia em que meu pai enfiou o cano da arma na boca dele e o fez jurar que nunca ia foder com a nossa família. Desde então, era sempre assim: meu pai entrava por uma porta e meu padrasto saía por outra. Só devia ainda estar naquela casa porque minha mãe deve ter brigado feito uma desgraçada pra ele não sumir de vez.

Na mão um saco, eu sabia o que era. Alguma porcaria que eu gostava quando criança e que até hoje ele trazia quando vinha aqui em casa.

— Diana, quer ver que ele vai perguntar se é dessas que eu gosto? — cochichei, rindo, e corri pra sala. — Paiiiieeeee!!!

Me joguei no colo dele com um abraço gostoso. Eu queria ter mais tempo de vida com meu velho, mas ele não tinha uma estrada fácil. Mesmo assim, quando me abraçava, parecia que nada no mundo podia me atingir. Me apertou tão forte que quase quebrou minhas costelas e me encheu de beijos estalados na bochecha — os mesmos que as duas meninas tinham me dado juntas na noite passada.

— Tome, menina… é dessas que você gosta? — falou baixo, cúmplice, me entregando um saco de plástico cheio de bala, biscoito recheado e umas notas de dinheiro enroladas no meio.

Pode parecer besteira, mas eu amava meu pai daquele jeito bruto, meio torto. Ele sempre tentava me agradar, me tratava como se eu ainda tivesse dez anos de idade. E eu adorava. O dinheiro? Não era muito, menos que o dinheiro da faxina que eu ganhei, meu acredita que jovens não devem ter dinheiro fácil.

Peguei o saco, conferi rindo o que tinha dentro e virei pra Diana com cara de vitória, confirmando que tinha acertado o que ele ia dizer.

— É sim, pai! Enntraaaa, vai!

Meu pai não perdeu tempo: foi direto pra cozinha, cumprimentou todo mundo como se fossem velhos amigos. E, na real, eram, do jeito torto que dava. Minha mãe se dava bem com ele na medida do possível, e com a Mariana então… era um grude. Ele sempre foi apaixonado por ela, tratava como se fosse filha também.

— Tio, quero dar uns tiros! Quando o senhor vai me levar? — disse Mariana, puxando saco. Ela odiava arma, mas não perdia a chance de se engraçar.

— Você? Nunca. — ele cortou seco. — Arma não é brinquedo, e você sabe disso.

Mariana fez um muxoxo falso, cruzando os braços como criança emburrada. Nisso, Diana se levantou pra apertar a mão dele, toda respeitosa.

— Olha que moça bonita! — ele riu pra ela, afetuoso. — Mas pega suas amigas e xispa pro quarto, que eu quero uma conversa de adulto aqui nessa cozinha.

Diana riu, sem jeito, e nós três subimos pro meu quarto, carregando o saco de guloseimas. O presente do meu pai ia ser detonado rapidinho.

Ficamos lá em cima conversando tentando não pensar no que ia acontecer, eu estava ansiosa e Diana parecia ter esquecido de queria ir embora. O almoço foi só macarrão, minha faz isso quando não quer cozinhar. Eu expliquei isso para a Diana, minha mãe não deve querer nenhuma de nós lá embaixo.

Meus pais e o meu padrasto estavam na sala, jogados vendo TV, como se nada tivesse acontecido. O tempo foi passando devagar, cada minuto parecia uma eternidade. Até que, lá pelas duas e pouca, meu telefone vibrou.

“Estou indo.”

O coração gelou.

— É agora! — falei, jogando o celular na mão da Mariana. E já saí disparada porta afora, gritando com a garganta em brasa:

— ELE TÁ VINDO!

Nossa, como eu tava nervosa naquela hora. Me tremia inteira dos pés à cabeça, feito vara verde, ansiosa com o que ia acontecer. Diana precisou até de um copo d’água com açúcar pra se acalmar, e até a Mariana — que nunca ficava quieta — estava muda, segurando meu telefone na mão como se fosse bomba.

A ordem era clara: eles ficariam na sala, e nós três na cozinha. Da cozinha dava pra ver a sala inteira, e como a entrada era lateral, o canalha só ia enxergar todo mundo depois que já tivesse botado os pés dentro de casa. Armadilha perfeita.

Meu pai se acomodou na cadeira do meu padrasto, porque ela ficava de frente pra porta. Ele nunca dava as costas pra porta nem pra janela, mania esquisita dele, mas que fazia sentido naquele momento. Depois, puxou outra cadeira e posicionou quase colada na televisão, de costas pra rua. Ali era o lugar que ele queria o moço sentado — como se fosse um réu esperando sentença.

Infinitos vinte minutos se passaram, só quem falou nesse tempo foi a televisão ligada e a minha mãe que falou para ele quase suplicando.

— Juízo homem, Juízo!

Continua