Capítulo 54
Eu namorei um cara por três anos e, no começo, aquele ciúme que ele exibia parecia cuidado, parecia zelo; eu até achava doce quando ele dizia que queria me proteger, até perceber que aquilo não era proteção, era cerca, e que eu, devagar, estava aprendendo a encolher para caber dentro do espaço que ele aprovava. Fui me afastando de amigas, desmarcando programas que sempre me faziam bem, vigiando o que eu postava e o que eu ria, medindo palavras para não acender um pavio que parecia sempre pronto. O ciclo era previsível: ele implicava com um nada, a briga estourava, eu me justificava até faltar ar, algumas horas depois ele voltava com olhos molhados e promessas de mudança, e eu, cansada e com medo de recomeçar sozinha, aceitava como se aquilo fosse amor e não exaustão.
Dessa vez foi pior. No trabalho, o Fernando, bonito e inconveniente, confundia educação com convite; eu disse não mais de uma vez, expliquei que era comprometida, pedi que parasse, bloqueei, depois desbloqueei achando que uma conversa clara resolveria, e repeti o “não” com todas as letras. Mesmo assim, meu namorado pegou meu celular sem pedir, abriu meu Instagram e foi cavando conversa por conversa até parar naquelas mensagens em que eu deixava explícito que não queria nada. Eu li junto com ele: “não é legal você insistir, eu namoro.” Estava escrito, cristalino, objetivo. Ainda assim, ele me olhou como se eu tivesse cometido um crime, apagou cada linha que não combinava com a história que já tinha decidido sobre mim e, com a voz firme de quem julga, me chamou de puta.
Eu desabei ali, não pelo xingamento em si, mas pela certeza que atravessou o peito: não importa o quanto eu seja correta, o quanto eu explique, o quanto eu me encolha para caber no limite dele; quando alguém escolhe quem você é na própria cabeça, a verdade não salva, só machuca. E naquele instante, com o rosto quente e a garganta fechando, eu entendi que não era sobre ciúme, era sobre controle; não era sobre amor, era sobre me quebrar até eu duvidar de mim.
Quando a cabeça fica atormentada a gente não pensa direito. Fiquei ruminando a vida que eu não vivi. As amigas que larguei pelo caminho, as festas que evitei, os lugares que deixei de conhecer, as bocas que não beijei por medo de despertar o ciúme dele. Deu uma fome de vida que arranhava por dentro, uma vontade de recuperar em uma noite tudo que eu tinha engolido em silêncio enquanto a voz dele martelava sem parar na minha mente: puta, puta, você é uma vadia, puta e traidora. Eu nunca traí. Nunca. E mesmo assim eu estava ali, encharcada de choro, com o rímel no queixo, tentando respirar entre soluços e entender por que a verdade não bastava.
Cansada, peguei o celular com a mão firme. Liguei.
— Fernando?
— Oi, não esperava você ligar. Mudou de ideia? Quer sair comigo, um jantar, talvez uma boate? — Sempre falando naquele tom jocoso de um algo à mais.
— Não, Fernando, eu não quero isso.
Ele riu, confuso.
— Hoje é sábado. Se não é trabalho, então por que você me ligou?
Eu respirei fundo. Senti o gosto amargo do nome que ele me deu grudado na língua.
E virei a chave.
— Eu quero foder. Quero te dar. Quero sentar em você a noite inteira até eu morrer.
Eu me arrumei como se fosse uma cerimônia. Banho longo até a pele ficar quente, esfoliante que deixou o corpo brilhando, depilação rápida, esmalte impecável. Prendi o cabelo de um jeito que mostrasse a nuca. Tirei do armário um vestido que há anos não usava, o meu velho e bom “pega macho”. Queria ser exatamente a imagem do xingamento que ele me lançou na cara: a de puta!
Marquei direto na casa dele porque sabia que tempo é trégua. Não queria pensar, não queria reconsiderar. Quando Fernando abriu a porta eu senti o olhar dele percorrer meu corpo, a avaliação óbvia de sempre. Ele tentou fazer alguma piada, perder a palavra, e eu fui mais rápida. Empurrei a porta com a mão e empurrei ele com a outra, guiando-o até o sofá.
— Cala a boca — disse baixo, sem pressa, deixando a força na voz. A mão no peito dele foi firme, uma ordem.
Ele arregalou os olhos, confuso, o medo presente como se nunca tivesse visto aquela versão minha.
— Que foi, maluca? — saiu dele, amedrontado.
Respirei, enxuguei um resto de dúvida que tentava aparecer, e falei como quem troca de pele.
— Hoje eu acordei puta.
Sentei no colo dele contra o sofá charmoso e caro. Na cozinha, um cheiro de molho exalava forte. A mesa posta para um jantar que não ia acontecer. O apartamento tinha a cara de homem solteiro que decora para impressionar e vive pouco ali. Eu não estava ali para jantar.
Ajustei o corpo sobre as pernas dele e segurei a barra do vestido para não ceder. Subi tecido até as coxas, lenta, deixando uma bela visão do porvir. O olhar de Fernando desceu sem cerimônia. As mãos, indecisas, pairaram no meu quadril.
— Você tá sem calcinha? — a voz dele saiu rouca, insana de desejo.
Encostei a boca no ouvido dele:
— Calcinha pra quê?
O beijo veio ensandecido e eu deixei, não porque fosse romântico, mas porque a raiva queimava e me dava fome. Segurei o rosto dele, mordi de leve, usei a boca como quem toma de volta um território. Ele apertou minha bunda com força e a outra mão veio pela frente, quente, encontrando meu sexo. Inclinei o tronco para trás e dei espaço, cavalguei os dedos dele no meu ritmo, fricção firme, direta, sentindo o meu púbis liso escorregar na palma como se eu tivesse sido feita para aquilo hoje.
— Assim — guiei, prendendo os punhos dele no lugar exato.
Baixei a alça do vestido com o ombro e deixei os seios à mostra, o tecido cedeu dependurado. Trouxe a boca dele até mim, roçando o mamilo na língua dele até ficar duro, apertando com força sua cabeça contra meu corpo.
— Chupa — falei baixo. — Forte, mama.
Ele obedeceu. A sucção veio densa, cadenciada, e eu continuei me movendo sobre os dedos dele, quadril solto, raiva e tesão misturados no mesmo impulso. Cada puxada de boca no meu seio eu respondia com o corpo inteiro, como se eu espremesse de dentro de mim a palavra que ele tentou colar em mim. Eu fazia som porque queria. Eu guiava porque era meu. E cada vez que eu descia um pouco mais, eu lembrava: hoje eu escolhi.
Levantei o corpo, tirei a mão dele de mim e apontei para o sofá com o queixo.
— Deita.
Ele obedeceu sem discutir. Abri o cinto, baixei o zíper, libertei o pau dele já duro na minha mão, algo completamente desinteressante para a minha decepção e subi pelo encosto até encaixar meu corpo sobre o rosto dele. Segurei a base com firmeza e, antes de qualquer cerimônia, sentei em sua boca sem cuidado algum.
A língua veio quente e direta. Eu rebolava no ritmo que me servia, esfregando o púbis liso no nariz e na boca, exigindo pressão, afogando o nome antigo que me deram. Quando a chupada dele acertou, baixei o tronco e abocanhei a cabeça do pau, lenta só no primeiro segundo, depois profunda, funda, decidida. Queria ouvir o gemido preso na garganta dele enquanto meu quadril marcava a cara dele.
Eu subia e descia em seu rosto com raiva e precisão, cada lambida respondida com mais garganta minha nele. A saliva começou a escorrer pelo meu punho, a língua dele tremia em mim, e eu apertei mais, engoli mais, deixei que o som molhado do meu ir e vir falasse alto na sala. Quando ele tentou guiar meu quadril, segurei os pulsos e prendi ao estofado.
— Eu dito o ritmo.
Voltei a sentar no rosto dele, pesando, movendo o clitóris contra a ponta da língua, exigindo. Desci de novo na rola, profunda, até o limite, e subi raspando os dentes de leve, devolvendo a pressão que eu sentia entre as pernas. Ele arfou. Eu não aliviei. Enchi a boca outra vez, a mão fechada na base, bombeando junto, enquanto o meu corpo esfregava no rosto dele faminto.
Alternava sem piedade: eu me oferecia e tomava, eu montava a boca dele e devorava o pau com a mesma fome. Quando a língua dele desenhava círculos mais rápidos, eu acelerava em resposta; quando eu afundava mais a garganta, eu rebolava mais forte em seu nariz, esmagando um gemido meu no assento, deixando claro meu domínio.
Senti a vibração do quase dele e parei um segundo só para respirar no ouvido:
— Ainda não. Primeiro eu.
Levantei, peguei ar, e dei a ordem sem dúvida:
— Vai. Fica de pé.
Ele se ergueu cambaleando. Virei de costas para o sofá, apoiei os braços no encosto e me arqueei de forma à ficar o mais exposta que podia. Puxei o vestido pela cintura e deixei a visão inteira da minha raba para ele.
— Mete! — Falei olhando por sobre o meu ombro.
Ele veio por trás, duro, urgente. Segurei a borda do sofá com os dedos brancos enquanto ele me preenchia. Marquei o ritmo com o quadril, rápido, profundo, só parando para ajustar o ângulo que me fazia ver estrelas. A sala virou barulho de pele, respiração curta e um rangido insistente do estofado.
Quando senti o meu clitóris latejar, levei a mão para baixo e me apertei no mesmo compasso. Ele gemeu perto da minha nuca, quente, descontrolado, as mãos firmes na minha cintura. Eu abri mais as pernas, empinei, aceitei cada estocada com um sorriso torto celebrando o êxtase.
O toque vibrou dentro da bolsa, um trinado conhecido cortando o ar que cheirava a sexo. Eu sabia quem era antes de ver. Estiquei o braço sem perder o ritmo, achei o celular no canto do sofá e deslizei para atender em vídeo. A tela iluminou meu rosto suado. Ele apareceu: o namorado. Olhos arregalados, a surpresa travada no meio da pergunta.
Mantive a câmera alta, pegando meu rosto e os meus ombros que balançavam no impacto. Não desviei.
— Olha aí, de tanto você falar que eu sou puta… — olhei direto para ele, firme, mas mal conseguindo pronunciar as palavras; por ódio e prazer — olha só no que você me transformou.
Atrás de mim, Fernando estremeceu. Eu trinquei os dentes e acelerei a mão no meu clitóris, o corpo inteiro pedindo agora. Meu futuro ex abriu a boca, mas não saiu som. Eu arfei, empurrei com o quadril, segurei o pau dele mais fundo, e deixei vir. O orgasmo me subiu como uma onda quente, queimando da lombar até a garganta. Gozei olhando para a tela, sem abaixar os olhos, deixando meu gemido preencher a chamada.
Senti Fernando pulsar dentro de mim e derramar quando meu corpo ainda tremia. Respirei, deixei a câmera descer devagar até o sofá, finalizei a chamada com um toque seco e soltei o ar em um riso curto, satisfeito, limpo.
Endireitei o vestido, ainda arfando, e pensei com a calma de quem recuperou o próprio nome.
Vingança feita, e Fernando? Ele nem era tão bom assim.

