Capítulo 12

No dia seguinte, ele não me ligou. Nem no outro. Nem na semana inteira que se passou.

Toda noite, eu entrava no Discord e lá estava: status offline. Só que eu sabia que era mentira. Eu via ele jogando, o nick piscando nas partidas, mas escondido de mim. E aquilo me matava. Eu até entendia ele não querer me mandar mensagem por causa da minha irmã. Entendia ele estar sem coragem, ou com vergonha de mim. Eu podia ser ruim de cama, ou talvez ele não quisesse lembrar da borrachada fraca que me deu. Mas se era isso… pra quê se esconder?

Minha irmã, por outro lado, falava dele normalmente durante a semana. Como se nada tivesse acontecido. Contava de encontro, de coisa boba, ria quando falava o nome dele. E eu ficava ali, engolindo seco, com o coração apertado, mais por ele ter chifrado ela comigo e eu não poder contar.

Na escola, acabei me aproximando mais da Amanda. A gente ficou mais juntas. O beijo da semana passada não tinha saído da minha cabeça, e pelo jeito da Amanda também não. A gente até comentou daquilo, relembrando, rindo baixinho. Concordamos que tinha sido bom. Muito bom.

Falamos de fazer de novo, claro. Mas não dava pra ficar matando aula sempre pra se encontrar. E se fosse na rua? Aí nenhuma das duas queria arriscar. Ficar se pegando em público, dar bandeira… não combinava. Então a tensão ficou ali, guardada, crescendo cada vez mais, sem ter pra onde escapar.

A merda toda bateu quando eu entrei no meu período fértil. Antes de dar, eu já subia pelas paredes. Agora que eu tinha provado, parecia que o corpo tinha descoberto uma fome nova — e eu precisava desesperadamente de alguém.

O problema? Os meninos que eu conhecia eram todos crianças. Moleques sem malícia, que mal sabiam beijar. Eu olhava pro telefone como se fosse a salvação.

— Quem será o sortudo? — murmurei, deslizando os dedos pela agenda.

— Miguel… pode ser o Miguel… — pensei alto. Mas morava longe, os pais dele nunca iam querer trazer ele aqui do nada.

— Tem o Pedro… mora aqui no prédio. Peguinha na escada? Hummm… por que não? — considerei, mordendo os lábios. Mas logo descartei: eu queria mais que um peguinha sem graça.

Suspirei alto.

— Cacete, é tão difícil arrumar alguém pra dar assim?

O tesão estava tão alto que pela primeira vez cogitei com seriedade: “e se fosse com a Amanda?” Pelo menos ela tinha boca, mãos e peitão delícia! Desde que me fizesse gozar, eu já estaria feita.

Deitei no colchão, encarando o teto, e soltei em voz alta:

— Dizem que mulher chupa melhor que homem… será verdade? Deve ser, né? — ri sozinha, nervosa, mas excitada com a ideia.

Continuei arrastando a lista até o fim, já perdendo as esperanças, até que…

— ZZBruno!!!! — quase gritei.

O nome dele estava salvo assim porque, no dia que anotei, o teclado do celular tava uma merda e saiu desse jeito. Parecia destino.

Não pensei duas vezes. Nem mensagem mandei. Liguei direto.

— Vamos lá, amigo… eu tô doidinha pra dar hoje. Por favor, não seja um imbecil. — murmurei, ansiosa, ouvindo o toque.

O telefone chamou. Chamou. Chamou.

— É, gente… pelo visto hoje vai ser no improviso. — falei sozinha, largando o celular na cama. — Agora é escolher entre o cabo da escova de cabelo ou o tubo de Rexona. E pelo jeito que eu tô, vai ter que ser o grossão, não o fininho.

Deixei o telefone de lado e fui pra sala. Mal sentei no sofá, meu celular começou a tocar. Tocou alto, como se fossem as trombetas anunciando a volta de Cristo. Eu quase pulei. Minha mãe também se assustou.

— Eita, maluca! Pelo visto tá esperando resposta de emprego! — gritou da cozinha.

— Não, tô querendo é algo pra fazer! — respondi correndo, disfarçando, e saí gritando pelo corredor.

— Lava uma louça pra mãe, então! — ela rebateu.

— Você tem lava-louças! — gritei de volta, já batendo a porta do quarto. — Xuxa tudo dentroooo!

O celular vibrava em cima da cama. Era ele: Bruno.

Atendi com o coração acelerado:

— Oi.

— Iai, Kika? — a voz dele era calma, arrastada.

— Tá onde? — perguntei direto.

— Sei lá… uns quinze metros embaixo de você.

— Tá na casa do seu pai?

— Tô. Ele me trouxe pra cá e meteu o pé. É mole? Tá afim de jogar?

Bruno já tinha sido meu duo em algumas partidas, mas era suporte também, nunca dava muito certo. Eu nem pensei.

— Não… vou passar aí. Pode ser?

Do outro lado, um silêncio rápido, e então:

— Já é.

O tesão queimava em mim que nem rastilho de pólvora.

Corri no banheiro pra me conferir. Me abaixei, puxei a saia, e olhei rápido: a pepeca não tava esquisita, tava cheirosinha, normal. Um alívio. Já estava vestida como quem ia ficar em casa: uma saia jeans curta e blusa básica. Soltei o cabelo, passei um batom clarinho só pra dar cor nos lábios e já saí voada porta afora, antes que minha mãe resolvesse encrespar.

— Mãe, vou no play! Tô levando o celular! — gritei.

Ela respondeu alguma coisa da cozinha, provavelmente o de sempre: juízo. Ela nunca deixava de dizer isso.

Desci os três lances de escada correndo, o coração batendo na boca, e toquei a campainha do Bruno.

O idiota abriu a porta de moletom, cara amassada, cabelo bagunçado, como se tivesse acabado de acordar de um cochilo. Ficou parado na porta, meio mole, como se não fosse me deixar entrar.

— Tava dormindo, mané? Acorda! — soltei, rindo pra disfarçar a ansiedade.

— Tava deitado, vendo jogo. — respondeu no automático, coçando a nuca.

— Quer fazer alguma coisa? — perguntei, já me jogando na chance.

— Sei lá… preguiça. — murmurou, bocejando.

Na hora me bateu um desânimo do caralho. “Porra, o imbecil não percebia que eu tava exalando feromônios? Que eu tava ali pronta, querendo pica_?”_

— Ahnn… tá. — falei sem graça, meio decepcionada.

Ele coçou a cabeça e abriu espaço.

— Entra aí, pô. Vamos lá pro quarto.

— Teu pai não vai achar ruim? — perguntei, tentando medir os riscos.

— Duvido que ele volte cedo. Saiu com mulher. — respondeu sem cerimônia.

— Eita… — soltei, surpresa, mas fingindo naturalidade.

Fui entrando. O corredor tinha aquele cheiro misturado de mofo e perfume barato de ambiente, coisa de apartamento de homem. Quando chegamos no quarto dele, senti um déjà-vu. Eu já tinha ido ali algumas vezes, quando éramos mais novos. A gente era amigo de infância, passava tardes jogando videogame, dividindo lanche, rindo de bobagem.

Mas as coisas mudaram quando os pais dele se separaram. Ele saiu da minha escola, foi morar com a mãe, e a gente perdeu contato. Só mais tarde, depois que o pai voltou a morar no prédio, que começamos a nos falar de novo.

Agora, estar ali de novo, mas com esse fogo queimando por dentro, parecia outra realidade. Eu não estava indo ver meu “amiguinho de infância”. Eu estava entrando no quarto de um cara que, se não fosse imbecil, ia acabar comendo minha buceta naquela noite.

E só de pensar isso, minhas pernas amoleceram.

Blá blá blá, papo sem importância que eu vou cortar porque não é disso que a gente lembra. O que importa mesmo foi quando ele virou pra mim e soltou:

— Pô, Kika… tu tá toda arrumada assim por quê?

— Arrumada, eu? — ri debochada. — Tô com roupa de ficar em casa, só passei um batonzinho. — Fiz um biquinho exagerado, só pra ele notar.

Ele riu, mas o olhar demorou.

— Tá gata, pô… — falou, meio sem jeito.

O coração bateu forte, e eu não perdi tempo:

— Você também é um gato. — respondi, apertando a bochecha dele como quem brinca, mas já deixando a deixa clara.

Por dentro eu gritava: Me beija, idiota! Eu tô de saia! O destino escolheu você!

É… não ia rolar. Eu já tava vendo a cena: eu ia ficar com o cabelo seboso, com cãibra na boca de tanto rir das piadas dele, e com torcicolo de tanto balançar a cabeça fingindo interesse. E ele, burro que só, nunca ia perceber que eu estava dando mole escancarado pra ele.

Foi aí que me bateu uma ideia muito filha da puta.

A gente tava sentados na cama dele, conversando fiado, e eu mudei de posição. Juntei os joelhos devagar, ajeitei a saia de um jeito que meus fundilhos ficassem mais à mostra. Não escancarado, não na cara dele — mas calculado. Se eu desse uma de desavisada, virasse o corpo ou me inclinasse, ele teria um ângulo perfeito.

“Vai que assim ele se anima pelo menos…” pensei, sentindo o coração acelerar só de imaginar o olhar dele descendo sem querer pro que eu estava mostrando. Fingi distração, mexendo no celular, rindo de qualquer bobagem, mas cada músculo meu estava atento, esperando a reação dele.

Ele olhou, mas eu não podia dar a entender que eu vi.

E …

Nada…

Quase duas horas depois de falar sobre um monte de coisa, eu me dei por vencida.

— Eu preciso ir, tou meio com sono…

— Beleza, to cheio de sono também, vou dormir nessa porra…

Eu sai da casa de com um ódio, mas com um ódio que você não pode imaginar.